sábado, 16 de julho de 2011

Usurpação de águas,Alteração de Limites de cercas, e Esbulho possessório sob a ótica jurídica-penal

USURPAÇÃO - Damásio de Jesus

Alteração de Limites


1. CONCEITO E OBJETIVIDADE JURÍDICA

Alteração de linwtes, de acordo com o art. 161, caput, do CP, é o fato de

"suprimir ou deslocar tapume, marco, ou qualquer outro sinal indicativo de

linha divisória, para apropriar-se, no todo ou em parte, de coisa imóvel alheia".

O CP protege a posse e a propriedade dos bens imóveis.

2. SUJEITOS DO DELITO

Sujeito ativo só pode ser o proprietário do prédio contíguo àquele em

que é realizada a alteração de limites. Isso ocorre porque somente o proprie-

tário do prédio limítrofe poderá, suprimindo ou deslocando tapume etc.,

beneficiar-se do imóvel alheio. Sujeito passivo é o proprietário ou possui-

dor do imóvel em que a conduta típica é realizada.

3. ELEMENTOS OBJETIVOS DO TIPO

A conduta típica consiste em suprimir ou deslocar tapume, marco ou

qualquer outro sinal indicativo de linha divisória. Suprimir significa fazer

desaparecer, anular. Deslocar quer dizer tirar do lugar. O comportamento

se dirige a tapume, marco ou qualquer outro sinal indicativo de linha divi-

sória. Tapumes são as cercas vivas, de arame farpado ou de madeira etc.

(CC, art. 588, § 2º). Marcos são sinais de pedra, madeira, cimento etc., que

servem para delimitar o imóvel. O CP se refere ainda a qualquer outro sinal

indicativo de linha divisória, como estradas, caminhos, muros, árvores etc.

4. ELEMENTOS SUBJETIVOS DO TIPO

O crime só é punível a título de dolo, consistente na vontade de supri-

mir ou deslocar tapume, marco ou qualquer outro sinal indicativo de linha

divisória. A incriminação, entretanto, exige outro elemento subjetivo do

tipo, contido na expressão "para apropriar-se, no todo ou em parte, de coisa

imóvel". Não basta que o sujeito tenha agido dolosamente. É necessário

que pratique a supressão ou deslocamento de tapume etc., com finalidade

específica de apropriar-se total ou parcialmente do imóvel alheio.

5. ELEMENTO NORMATIVO DO TIPO

Está contido na expressão "alheia". Assim, não há fato típico quando

se trata de imóvel próprio.

6. QUALIFICAÇÃO DOUTRINÁRIA

A alteração de limites é crime formal e não material. Isso decorre da

circunstância de o tipo descrever a conduta (suprimir ou deslocar) e o re-

sultado (apropriação total ou parcial do imóvel alheio), não exigindo a sua

produção. Como se nota na definição legal, é suficiente que o sujeito rea-

lize a conduta para o fim da apropriação. Este é o resultado visado. Entre-

tanto, não é necessário que efetivamente se aproprie total ou parcialmente

do imóvel alheio. Trata-se de crime de consumação antecipada, consuman-

do-se no instante imediatamente anterior à produção do resultado.

7. CONSUMAÇÃO E TENTATIVA

A alteração de limites atinge a consumação com a efetiva supressão

ou deslocamento de tapume, marco etc., não sendo necessário que alcance

efetivamente o objetivo visado. A tentativa é admissível, desde que o sujei-

to não consiga suprimir ou deslocar o sinal indicativo de linha divisória por

circunstâncias alheias à sua vontade. Ex.: o agente é surpreendido no ato de

iniciar a retirada de palanques de uma cerca.

8. PENA E AÇÃO PENAL

A alteração de limites é punida com pena de detenção, de um a seis

meses, e multa.

Se o agente usa de violência, incorre também na pena a esta cominada

(§ 2º). Isso significa que se emprega violência física, ocorrendo lesão cor-

poral, responde por dois delitos em concurso material: alteração de limites

e lesão corporal leve, grave ou gravíssima. O mesmo acontece quando,

empregando violência, vem a matar alguém. Se apenas realiza a conduta

com vias de fato, estas ficam absorvidas pelo crime, não sofrendo punição

autônoma. Se a propriedade é particular e não há emprego de violência, a

ação penal é de natureza privada. Caso contrário, se a propriedade é públi-

ca e o sujeito emprega violência, a ação penal é pública incondicionada.

USURPAÇÃO DE ÁGUAS


1. CONCEITO E OBJETIVIDADE JURÍDICA

Usurpação de águas constitui o fato de o sujeito desviar ou represar,

em proveito próprio ou de outrem, águas alheias (CP, art. 161, § 1º, I).

O CP protege a inviolabilidade patrimonial imobiliária, no que concerne

à utilização e gozo das águas, que são pelo CC consideradas imóveis (art.

43, I), quando não mobilizadas.

2. SUJEITOS DO DELITO

Qualquer pessoa pode ser sujeito ativo de usurpação de águas. É quem

desvia ou represa, em proveito próprio ou de outrem, águas alheias. Sujeito

passivo é quem sofre o dano em face do desvio ou represamento.

3. ELEMENTOS OBJETIVOS E SUBJETIVOS DO TIPO

O tipo possui dois verbos: desviar e represar. Desviar significa mudar

o rumo do curso da água. Represar significa impedir que as águas corram

normalmente.

As águas podem ser públicas ou particulares. São públicas, de acordo

com o Código de Águas (Dec. nº 24.643, de 10-7-1934), os mares territoriais,

golfos, baías, enseadas e portos; correntes, lagos e canais, navegáveis ou

flutuáveis; as correntes de que se formam estas águas; as fontes e reserva-

tórios públicos; as nascentes consideráveis; os braços e correntes públicas,

que influam na navegabilidade ou flutuabilidade das mesmas (art. 2º). Aguas

particulares são as nascentes e todas as que se situam em terrenos particu-

lares (art. 8º).

O crime só é punível a título de dolo: vontade de desviar ou represar

águas. Exige-se outro elemento subjetivo do tipo, contido na expressão "em

proveito próprio ou de outrem". Assim, inexiste a tipicidade do fato quando

o sujeito realiza a conduta por outro motivo, como o de vingança, e não

para obter proveito próprio ou de terceiro.

4. ELEMENTO NORMATIVO DO TIPO

O advérbio "alheias" constitui elemento normativo do tipo. Se as águas

desviadas ou represadas são próprias, inexiste a tipicidade do fato.

5. QUALIFICAÇÃO DOUTRINÁRIA

O crime de usurpação de águas é comum, de dano, material, instantâ-

neo eventualmente permanente e simples.

Comum, pode ser praticado por qualquer pessoa.

Por se tratar de crime de dano, exige a efetiva lesão do bem jurídico

(inviolabilidade patrimonial imobiliária).

Simples, atinge um só interesse jurídico (direito à utilização e gozo

das águas).

É crime instantâneo, consumando-se no momento do desvio ou represa-

mento. Eventualmente, perdurando esses estados, se transforma em perma-

nente.

6. CONSUMAÇÃO E TENTATIVA

O crime atinge a consumação com o efetivo desvio ou represamento

de águas alheias. É irrelevante que o sujeito, com o desvio ou represamento,

consiga o efetivo proveito próprio ou de terceiro. A tentativa é admissível.

Ex.: o sujeito é surpreendido no ato de iniciar o desvio de um córrego.

7. PENA E AÇÃO PENAL

Aplica-se o que dissemos em relação à alteração de limites.

ESBULHO POSSESSÓRIO

1. CONCEITO E OBJETIVIDADE JURÍDICA

De acordo com o art. 161, § 1º, II, esbulho possessório é o fato de

invadir com violência a pessoa ou grave ameaça, ou mediante concurso de

mais de duas pessoas, terreno ou edifício alheio, para o fim de tirar a posse

da vítima.

Objeto jurídico imediato é a posse do imóvel. De forma secundária, o

tipo penal protege outros objetos jurídicos, como a tranqüilidade espiritual

e a incolumidade física de quem se acha na posse.

2. SUJEITOS DO DELITO

Sujeito ativo pode ser qualquer pessoa, salvo o proprietário, uma vez

que a figura típica se refere a "terreno ou edifício alheio" (grifo nosso).

Sujeito passivo é o possuidor do imóvel (proprietário, arrendatário,

locador etc.).

3. ELEMENTOS OBJETIVOS DO TIPO

O núcleo do tipo é o verbo invadir, que significa incursionar, penetrar.

É necessário que a invasão se dê:

1º) com violência a pessoa ou grave ameaça;

2º) mediante concurso de mais de duas pessoas.

Na primeira hipótese, o sujeito emprega violência física contra a pes-

soa ou grave ameaça. Na segunda, exige-se no mínimo quatro pessoas: uma

que invade e mais três. O tipo penal se refere a "concurso de mais de duas

pessoas". Não é preciso que todos estejam presentes no local do fato. As-

sim, há o delito de esbulho possessório quando uma pessoa determina a

outras três que invadam terreno alheio.

O CP não tutela a simples turbação da posse. É necessário que o sujei-

to pratique o fato com fim "de esbulho possessório", i. e., que realize o

comportamento com a intenção de espoliar o sujeito passivo do exercício

da posse do imóvel.

4. QUALIFICAÇÃO DOUTRINÁRIA

Trata-se de crime formal ou de consumação antecipada. A conduta é

invadir, com violência a pessoa ou grave ameaça, ou mediante concurso de

mais de duas pessoas, terreno ou edifício alheio. O resultado visado pelo

agente é o esbulho possessório. Entretanto, para que exista o crime não é

necessário que consiga espoliar o sujeito passivo da posse. É suficiente que

invada com essa intenção. Daí a natureza formal do delito.

5. ELEMENTOS SUBJETIVOS DO TIPO

O crime só é punível a título de dolo, que consiste na vontade de inva-

dir, com violência a pessoa ou grave ameaça, ou mediante concurso de mais

de duas pessoas, terreno ou edifício alheio. Há outro elemento subjetivo do

tipo, contido na expressão "para o fim do esbulho possessório". Assim, a

figura típica exige que o sujeito realize a conduta com um fim determinado:

o de excluir o sujeito passivo do exercício da posse, submetendo o imóvel

à sua disponibilidade.

6. CONSUMAÇÃO E TENTATIVA

O crime atinge a consumação com a conduta de invadir. É admissível

a tentativa, desde que o sujeito não consiga entrar no terreno ou edifício

alheio por circunstância alheia à sua vontade.

7. PENA E AÇÃO PENAL

Aplica-se o que dissemos em relação à alteração de limites.

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